Este texto foi
escrito pela professora e doutora em educação Tatiana Lebedeff:
https://institucional.ufpel.edu.br/servidores/id/27968
"Tenho recebido e
compartilhado vários 'memes' que falam da incompatibilidade do homeoffice com o
homescholling. São várias as mães, eu entre elas, conhecidas e amigas,
assoberbadas com o isolamento social tendo que dar conta das compras, comida
dentro de casa, demandas do trabalho remoto, lidar com as notícias diárias de
infectados e mortos e, ser tutora EAD dos filhos. Ninguém estava preparado para
a educação domiciliar: nem escolas, nem crianças, nem famílias.
As escolas não são mágicas para
tirarem das cartolas aulas e atividades EAD para todos os anos em todas as
disciplinas. As mães não são professoras “experts” em todos os conteúdos de
todas as disciplinas. As crianças, também estressadas pelo isolamento, não
possuem experiência com aulas EAD e não compreendem que estar em casa não
significa férias.
Óbvio que tem muita gente
irritada, ansiosa, frustrada com a sua 'incompetência pedagógica' questionando
como os conteúdos serão recuperados, discutindo a necessidade de turnos
inversos para dar conta do que está 'atrasado', enviando e-mails e telefonemas
para as escolas perguntando quais serão as estratégias de
'recuperação'.
A instituição onde trabalho
prorrogou por mais uma semana o isolamento. As crianças voltarão para as
escolas dia 06/04? Dúvida no ar, talvez tenhamos mais tempo de crianças em
casa.
Ontem, quando li um monte de
mensagens angustiadas sobre as aulas EAD e o que e como deve ser recuperado
fiquei pensando: o que é 'atrasado' no currículo de crianças que estão fazendo
10 anos, que estão no 4º ano do Ensino Fundamental? O que é conteúdo 'atrasado'
em qualquer segmento escolar?
Na verdade o que eu espero quando
as crianças voltarem para as escolas, é que tenham uma semana 'sem aula', que
elas fiquem correndo e gritando nos pátios como os 'hamsters do capirote' até
perderem a voz !!
Que as escolas mandem na agenda o
seguinte bilhete:
'Venham com roupa que possa ser
rasgada, para que elas possam ralar os joelhos e cotovelos de tanto rolar na
terra; que comam tatu-bolinha; que tomem banho de mangueira e muito, muito sol;
que façam penteados malucos; que dancem muito e joguem bola até caírem exaustas
no chão.'
Depois disso, gostaria que as
escolas refletissem com as crianças o que significou essa experiência para
elas, para as famílias. Que falem sobre resiliência, enfrentamento de
frustrações, sobre solidariedade.
Temos que levar alguma lição do
que estamos vivendo, temos que fortalecer nossas relações como famílias e como
sociedade.
As escolas PRECISAM falar sobre a
necropolítica, que resolve quem vale à pena viver ou morrer. Não quero ver
crianças confinadas, novamente, nas escolas em turno inverso para 'recuperar'
locuções adverbiais.
Se é que elas terão que ficar no
turno inverso, é para que aprendam a ser mais humanas, menos egoístas, mais
sensíveis.
Em vinte e poucos anos serão os
amiguinhos ranhentos do meu filho que poderão estar 'selecionando' os com
mais de 80 anos para serem mortos, eu estarei na fila.
Uma psicóloga conhecida comentou
que ninguém imagina o impacto que essa pandemia terá, em longo prazo, nas
subjetividades das crianças e jovens que a estão enfrentando.
Que a gente possa, agora, pensar
nesses efeitos e repensar o papel da escola na volta às aulas...
Nesse momento, acredito, é mais
importante preocupar-se com a saúde mental das crianças e jovens do que com o
conteúdo a ser 'vencido'."
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